terça-feira, abril 04, 2006

333) Um debate sobre os cursos de RI no Brasil...

No seguimento de minha "Frase infeliz" (ver este link: http://textospra.blogspot.com/2006/04/61-que-frase-mais-infeliz.html), recebi vários comentários de leitores e interessados num debate sobre a utilidade dos cursos de relações internacionais e suas interações com o mundo profissional.
Seleciono algumas dessas mensagens para lançar um debate sobre esta temática.

De: Vivian Muller
Em 4 de abril de 2006


Prof. Paulo Roberto e demais colegas, boa tarde!
Acabo de tomar conhecimento da matéria em questão e, conjuntamente, da sua justificativa.
Creio que não fui a única pessoa que entendeu o significado de sua frase, mesmo já tendo discordado - dentro do meu restrito campo de conhecimento - das suas considerações algumas vezes, como no caso das suas regras modernas de diplomacia, quando o senhor trata da relação entre direito e diplomacia. Ainda discordo, e muito, porém com argumentos mais efetivos. Tratemos disso em outra oportunidade.
Não resta dúvida de que houve uma tremenda infelicidade na construção da frase em questão, que transcrevo:
"Não tenho certeza de que esse seja o melhor caminho para quem aspira a ser alguma coisa na vida, pois se trata de uma área relativamente nova e não suficientemente "testada" nos mercados de trabalho."
No entanto, se me permitem os colegas, a frase não é de todo imprestável. Quem tiver interesse em pesquisar o tema ou tempo para fazê-lo, poderá coletar informações sobre todos os cursos autorizados/criados e em funcionamento e constatará facilmente o que o senhor ponderou: a área de Relações Internacionais (digo, estudo, pesquisa e ensino) é muito nova, muito inexperiente.
Vamos aos números:
A reportagem diz que há no Brasil atualmente 84 (oitenta e quatro) cursos criados no Brasil. No entanto, segundo o INEP, órgão oficial ligado ao MEC, são 83 (oitenta e três) os cursos de BACHARELADO EM RELAÇÕES INTERNACIONAIS (contando todas os cursos autorizados/criados pelo sistema federal e estadual de ensino). O curso da Universidade São Marcos está registrado como BACHARELADO EM DIPLOMACIA E RELAÇÕES INTERNACIONAIS. Enfim, trabalhemos com os dados do INEP.
Em São Paulo, estão funcionando 26 (vinte e seis) dos 30 (trinta) cursos autorizados/criados. Erro da reportagem que salienta ainda, que os números são de cursos oferecidos por Instituições de Ensino Superior em 2005, o que não é verdade. O fato é que até dezembro de 2005 os referidos cursos estavam autoridados/criados e não em funcionamento. Estes dados foram confirmados pelas próprias instituições; lembrando, não estou computando a São Marcos. Não tenho dados ainda da relação entre cursos autoridados/criados e em funcionamento no Brasil todo.
Outro erro da reportagem é dizer que na década de 80 havia dois cursos. Vejamos:
Década de 70 – 1 curso (UnB, criado em 01/08/1974);
Década de 80 – Nenhum curso foi criado;
Década de 90 (até 1999) – 21 (vinte e um) cursos criados;
Após 2000 (até 12/2005) – 61 (sessenta e um) cursos criados.
Os números comprovam que há, efetivamente, alguma coisa funcionando de forma “anormal”, usando suas palavras. Do número total de cursos no Brasil, 73,5% foram autorizados/criados muito recentemente. O mais espantoso é o número de vagas autorizadas/criadas: 8.490 por semestre (responde a sua pergunta sobre quantos são os “internacionalistas” postos no mercado?), cálculo efetuado com base nos dados oficiais (excetuando-se dos dados de quatro cursos que não há referência). Claro que o número real dos que concluem é bem menor, mas eu desconheço esse dado.
Os números por si só já são alarmantes, não fosse o desconhecimento por parte de coordenadores de curso e professores (sem contar do pessoal técnico-administrativo das Instituições de Ensino Superior e do próprio MEC que fazem a análise do material encaminhado pelas IES para aprovação) acerca do que deveria ser elementar: a diferencia entre cursos de Relações Internacionais, Comércio Exterior e Gestão de Negócios Internacionais (Administração com ênfase em Negócios Internacionais), o que justifica sua afirmação de que os cursos têm apenas “aspecto” internacional, não necessariamente, oferecendo conteúdo específico de Relações Internacionais. Quer piorar o que já aparenta ser tenebroso? Converse com cada um dos coordenadores de curso de R.I., os em funcionamento e os que somente estão autorizados/criados. É sofrível e muito preocupante!
O que me parece é que o “mercado” da educação achou uma suposta “galinha dos ovos de ouro” com Relações Internacionais, pois não há quase nada normatizado pelo MEC, a não ser uma “orientação” dita Padrões de Qualidade (muito questionável, por sinal!); não existe nenhum órgão de profissionais que seja realmente atuante na melhoria da qualidade desses cursos; e, o mais lastimável, não há estudos técnicos e/ou científicos sobre educação em Relações Internacionais e a realidade brasileira.
Na minha área, por exemplo, o oferecimento das disciplinas jurídicas é uma piada. O principal problema, creio, está na identificação do objeto jurídico para as Relações Internacionais e para a ciência do direito. Objetos totalmente opostos! Só que nos cursos de R.I. o conteúdo jurídico é o mesmo oferecido aos bacharelando em Direito naquelas matérias, digamos, “comuns”, como o Direito Internacional. Isso acarretar conseqüências, tanto para os profissionais que serão absorvidos pelo setor público ou pelo setor privado.
O que devemos extrair desse episódio, Prof. Paulo Roberto, é que o debate é necessário, pois a situação é realmente preocupante. Não sei avaliar sua amplitude, mas devemos nos ater ao fato de podemos estar realmente “testando” os cursos e seus resultados práticos, eis que ninguém ainda se atreveu a pesquisar e desmentir, assim, tal suposição. Infelizmente, temos apenas um ou outro acadêmico interessado em se dedicar à pesquisa em educação superior em R.I., mas um dia isso se fará impostergável.
Aceite meus cordiais cumprimentos e minha estima por todo seu trabalho, principalmente na área acadêmica, sem diminuir sua atuação na diplomacia, mas, creio, sua intensa produção é de fundamental importância para o ensino, a pesquisa e a prática de R.I.
Cordialmente,
Vivian Cristina Müller
Unimep, Piracicaba

1 Comments:

Anonymous Anônimo said...

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segunda-feira, julho 03, 2006 8:54:00 AM  

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