sábado, maio 13, 2006

418) Brasil vs Bolivia: entrevista Luiz Olavo Baptista


Um vexame históricoO BRASIL FOI HUMILHADO
O jurista Olavo Baptista: Morales fez o jogo de Davi contra Golias

O jurista paulista Luiz Olavo Baptista tem uma função estratégica nas disputas econômicas internacionais. Há quatro anos, ele ocupa uma das sete cadeiras do órgão de apelação da Organização Mundial do Comércio, uma espécie de suprema corte global dos negócios. Baptista ficou indignado com a reação do governo Lula à invasão das refinarias da Petrobras promovida pelo governo boliviano. Nesta entrevista ao repórter Fábio Portela, ele diz que Lula submeteu o Brasil a um vexame histórico.

A BOLÍVIA DESRESPEITOU REGRAS DO DIREITO INTERNACIONAL AO TOMAR AS REFINARIAS DA PETROBRAS?
A principal regra do direito internacional é que os Estados devem se tratar com respeito. A Bolívia, ao contrário, humilhou o Brasil. O que o presidente Evo Morales fez é inaceitável sob qualquer ponto de vista. Estou inconformado com o episódio e tenho a impressão de que o Brasil inteiro também está. O pior é receber o desaforo, a humilhação, e ver que quem deveria falar por você não só deixa de reagir como diz que o outro está certo. É um vexame histórico.

COMO O GOVERNO DEVERIA TER DEFENDIDO OS INTERESSES BRASILEIROS?
Em primeiro lugar, era preciso deixar claro que o Brasil não aceita a forma como foi feita a tomada das refinarias, com tropas, invasões e aquela encenação toda. Morales poderia ter alcançado o mesmo resultado sem humilhar o Brasil. Por que agiu assim? Por uma razão política. Ele usou o Brasil para dizer ao povo boliviano: olha, eu sou o Davi e derrubo o Golias com uma pedrada só. Fez uma humilhação calculada. Portanto, a primeira coisa que deveria ter sido feita era exigir um pedido formal de desculpas, o que, aliás, também faz parte das negociações internacionais.

O QUE O BRASIL GANHARIA COM UM PEDIDO DESSES?
A posição brasileira nas negociações sairia fortalecida. Do jeito que a coisa vai, os bolivianos continuam falando grosso e fazendo ameaças mesmo depois de terem tomado os ativos da Petrobras. O Brasil ficou do jeito que está – de joelhos – porque não reclamou. Quem vai respeitar o Brasil depois disso?

E O QUE PODERIA SER FEITO PARA COMPENSAR O PREJUÍZO DAS EMPRESAS QUE PERDERAM SEUS ATIVOS?
Esse seria o segundo passo. Depois do pedido de desculpas, o governo deveria exigir que a Bolívia ressarcisse imediatamente os brasileiros. Também seria preciso montar equipes de advogados e levar o caso para a Corte Internacional de Haia. Isso não ocorreu. Outra opção seria oferecer proteção diplomática às empresas, dando uma garantia oficial aos investimentos brasileiros.

COMO FUNCIONA A PROTEÇÃO DIPLOMÁTICA?
O mecanismo é assim: o governo entra com ações junto às cortes internacionais para obrigar a Bolívia a indenizar o Brasil pelos bens expropriados. No caso específico, os ativos da Petrobras. A Bolívia, então, teria de explicar por que se acha no direito de tomar os bens alheios. Só se poderia discutir o assunto da forma camarada como o Itamaraty está fazendo depois que essas providências fossem tomadas.

ENTÃO NÃO FOI UMA BOA ESTRATÉGIA ABRIR NEGOCIAÇÕES IMEDIATAMENTE?
Foi péssimo. E pior: as conversas nunca deveriam ter sido abertas pelos presidentes. Nenhuma negociação internacional deve começar pelos chefes de Estado, porque, em última instância, são eles que vão decidir. Quando os presidentes entram em campo, acaba a margem de manobra que os diplomatas têm para negociar. Por isso, qualquer amador sabe que assuntos dessa natureza e complexidade devem primeiro ser tratados em nível ministerial. Lula aceitou aquela reunião na Argentina, e o que aconteceu? Morales apareceu lá com Hugo Chávez a tiracolo, posando de organizador da reunião. Nessa hora, Chávez enterrou Lula definitivamente e acabou com qualquer pretensão do Brasil de ser uma liderança latino-americana.

O CHANCELER CELSO AMORIM GARANTE QUE A LIDERANÇA DE LULA NA AMÉRICA LATINA SEGUE FIRME.
O ministro Amorim sabe o tamanho do estrago e tenta remediá-lo. Ele declarou que Lula deu um pito em Chávez e em Morales nos bastidores. Se isso tivesse de fato ocorrido, não deveria se tornar público. Um diplomata experiente como Amorim não divulgaria essa informação. O que ele quer é preservar a imagem do presidente. Com essa intenção, acaba atuando como uma espécie de marqueteiro internacional de Lula. Dessa forma, ele está destruindo sua reputação e sua carreira.

ALÉM DA HUMILHAÇÃO, QUE OUTROS REFLEXOS A CRISE COM A BOLÍVIA PODE TRAZER?
Para os empresários nacionais, é uma tragédia. O governo sinalizou o seguinte: não invistam no exterior, porque eu não vou protegê-los. Para o resto do mundo, o recado é ainda pior: se o investimento é de brasileiro, pode passar a mão grande, porque o país não reage. Se o governo não faz nada pela Petrobras, da qual ele é dono, imagine por outras empresas brasileiras.

A FRANÇA E A ESPANHA TAMBÉM FORAM ATINGIDAS PELAS MEDIDAS DE MORALES. REAGIRAM COMO O BRASIL?
Não. Tomaram as providências cabíveis. Notificaram à Bolívia que querem ser indenizadas imediatamente, e seus advogados já trabalham para contestar judicialmente as expropriações.

O BRASIL PODERIA, ENTÃO, TER-SE RECUSADO A NEGOCIAR O REAJUSTE DO PREÇO DO GÁS BOLIVIANO?
Claro. O Brasil deveria exigir o cumprimento dos contratos já firmados. Eles prevêem o reajuste de preço a cada três meses, seguindo oscilações do petróleo. Também prevêem a possibilidade de alteração de suas cláusulas a cada cinco anos. Por causa disso, não se pode dizer que os contratos não sejam equilibrados. Não há por que rasgá-los de uma hora para a outra. Querem discutir o preço do gás? Tudo bem, mas é preciso levar em conta outros elementos. Inclusive o fato de que o Brasil pagou, durante anos, por um gás que não consumiu. A Petrobras poderia ser compensada por isso. Seria legal, legítimo e civilizado. Mais: se Morales quer mudar as regras, por que não vai a Brasília negociar? O governo Lula, ao contrário, despacha autoridades para discutir as regras em campo adversário.

O BRASIL E A BOLÍVIA INTEGRAM A COMUNIDADE SUL-AMERICANA DE NAÇÕES. OS ATOS DE MORALES NÃO PODERIAM SER QUESTIONADOS NO ÂMBITO DESSA ASSOCIAÇÃO?
Nunca vi, na história recente, uma época em que o Brasil estivesse tão isolado na América Latina como agora. Veja: o país tentou emplacar o presidente da OMC e ficou sozinho. Tentou o presidente do Banco Mundial e também ficou sozinho. No Conselho de Segurança da ONU, além de estar sozinho, ainda enfrenta a oposição de países como a Argentina. Nessa crise com a Bolívia, nenhum outro país fez um gesto sequer de solidariedade.

A POLÍTICA EXTERNA DE LULA NAUFRAGOU?
Desde o barão do Rio Branco, a política externa brasileira sempre teve a mesma linha mestra. Neste governo, houve uma guinada política muito grande. Trocamos o pragmatismo pela ideologia, e a coisa saiu dos trilhos. Desde que o presidente Lula assumiu, o país perdeu respeito na América Latina.

1 Comments:

Anonymous Anônimo said...

Very pretty design! Keep up the good work. Thanks.
»

segunda-feira, julho 03, 2006 8:51:00 AM  

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